domingo, 22 de maio de 2011

INVESTIMENTOS MUDAM A FACE DE VITÓRIA


INDÚSTRIA Perto do Recife e gozando de benefícios maiores por estar no interior, município vem atraindo cada vez mais empresas

Carla Seixas
cseixas@jc.com.br


Há cerca de 10 anos, o projeto de duplicação da BR-232 foi iniciado e causou uma verdadeira revolta por parte dos moradores e políticos do município de Vitória de Santo Antão. Sob a justificativa de que a rodovia passaria por fora da cidade, os moradores diziam que a cidade “minguaria” sem o tráfego rotineiro de quem segue ou volta do interior. Por ironia do destino, é justamente nessa rodovia onde há um outdoor chamando a cidade de “a terra de novas oportunidades”.

Para dar credibilidade à afirmação – para lá de otimista – estão investimentos de gigantes como Kraft Foods e Sadia, além de outras 11 indústrias contabilizadas só em 2010 pelo governo do Estado para gozarem de benefícios e construírem fábricas no município, distante 55 quilômetros do Recife. Nos últimos anos já foram 21 novos investimentos.

O secretário de Planejamento da Prefeitura, José Barbosa, diz que o crescimento foi tanto que hoje até falta distrito industrial para posicionar as empresas. “Temos três distritos. O primeiro deles, com 270 hectares, já era uma área da prefeitura, e tem 30% de área de preservação. O restante está ocupado por empresas. O segundo foi o distrito criado para a Kraft Foods, onde metade vai abrigar outras empresas, como a Eurobras, Converplast e a Fante, uma produtora de vinhos. Há uma outra área onde três empresas já reservaram terreno”, comentou o secretário.

Entre as que estão no 3º distrito estão a Metalfrio, cujo investimento é de R$ 50 milhões, com geração de 300 empregos e produção de freezers comerciais usados em supermercados e bares. “Queremos ajuda do governo estadual para implantar novos distritos”, diz Barbosa. O diretor de Infraestrutura da AD Diper, Paulo Roberto Correia, embora reconheça o destaque de Vitória na atração de investimentos, diz que não há planos para direcionar dinheiro para novas desapropriações. “A gente trabalha com demandas específicas. Se houver alguma empresa precisando de espaço para se instalar, a gente pensa”.

Uma dificuldade impensável há poucos anos. Vale lembrar que Vitória era conhecida por abrigar basicamente a fábrica da Pitú e a da CIV. Hoje, quem passa na frente da Sadia até acha a Pitú uma fábrica pequena. A Sadia produz na unidade 6.500 toneladas/mês de embutidos e emprega 930 pessoas, prevendo chegar a 1.200 em 2012. Questionado se acreditava que o município viveria a desejável problemática de não ter terreno para empresas, o secretário admite que não. “Um dos termômetros é a própria prefeitura, que hoje não tem mais aquelas filas de gente pedindo emprego”. A empolgação com as empresas é tanta que um painel enorme foi instalado na fachada da sede da prefeitura quantificando os empregos gerados por cada indústria que está ou vai se instalar na cidade.

Entre as citadas está a Isoeste, uma empresa líder no desenvolvimento de tecnologia de produtos com isolação térmica, e que hoje tem cerca de 70 empregados. O diretor comercial da empresa, Fabiano Lima de Souza, se diz muito satisfeito com o mercado local. Com uma produção de 100 mil metros quadrados por mês, entre sistemas de cobertura, painéis e as chamadas salas limpas, tem no portfólio a construção da unidade da Kraft e um dos blocos da Hemobrás. “Temos um bom mercado no Nordeste e os incentivos fiscais nos ajudaram a decidir pelo município. Em Vitória estamos relativamente perto de Suape, por onde importamos matéria-prima”. E como Vitória é no interior, os incentivos fiscais são ainda maiores para a instalação, chegando a 95% do ICMS cobrado.

Seu Elias da Silva, dono da Feijoada do Elias, hoje já sente melhora no próprio negócio. “Acredito que vai melhorar ainda mais”, afirma ele, cujo restaurante chega a atender 6.000 pessoas por mês e que agora vai investir R$ 100 mil para quase dobrar a capacidade da casa.
(Jornal do Commercio).

Capacitação ainda é baixa no município
No Centro Acadêmico de Vitória, divisão da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) na cidade, são ofertados cursos como enfermagem, nutrição e educação física. Já o campus do Instituto Federal de Pernambuco hoje proporciona formação técnica em áreas como Agricultura, zootecnia e agroindústria. Formações bem distantes da nova realidade econômica do município. Não há, sequer, uma unidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Indústrial (Senai) para dar suporte à demanda das indústrias na região. Qualquer formação precisa ser ou bancada pela própria empresa que está se instalando.

“Estamos negociando pelo menos uma unidade móvel, mas ainda não temos notícia de que vamos conseguir ”, disse o secretário de Planejamento, José Barbosa, admitindo que atualmente não há nenhum curso técnico em andamento na cidade sob a gestão da prefeitura e voltado para a nova demanda industrial do município.

Por enquanto fica mesmo a cargo das empresas treinarem como podem os novos trabalhadores. Para a Kraft, uma parceria foi feita e o poder público local se encarregou de bancar os espaços usados para as aulas. Isso foi feito dentro do que a empresa chama de Universiade de Alimentos, um programa usado pela indústria para capacitar mão de obra.

O diretor comercial da Isoeste, Fabiano Lima de Souza, diz que até agora determinados cargos ainda estão vagos porque não encontra mão de obra. “Fica caro trazer uma pessoa do Recife e bancar esse custo de deslocamento, ao mesmo tempo que aqui não tem profissional formado em designer de produtos, por exemplo”, destaca.

Outro ponto negativo é o crescimento da violência na cidade. Embora nem a prefeitura tenha tais indicadores, o sentimento nas ruas já é de que algo mudou com a atração de mais pessoas para viver na cidade, o que impacta tanto positivamente quanto negativamente.

Indústria virou nova meta

Foi um carro de som que levou para muitos moradores de Vitória de Santo Antão a esperança de um novo emprego. Quando a Kraft Foods resolveu começar o processo seletivo apostou nessa forma de comunicação para chamar a atenção dos moradores. E deu certo. Cerca de 15 mil currículos foram entregues de olho nas cerca de 400 vagas abertas pela indústria. A expectativa é chegar a 600 contratados.

A procura foi tanta que até as famosas lan houses ficaram lotadas de trabalho. “Quando fui tentar fazer o meu currículo, já no final da tarde, o rapaz disse que não estava mais pegando nenhum currículo porque já tinha muito trabalho”, comenta a hoje auxiliar de produção da linha de refrescos da Kraft, Elane de Conceição Silva. “Fiquei triste”, diz. Mas Elane já tinha registro na Agência do Trabalho e acredita que por isso ligaram para ela meses depois para convocá-la para a seleção. “Morei um tempo em São Paulo. Fui em busca de oportunidade, mas terminei voltando porque estava com uma filha pequena e queria ficar perto da minha família”, comenta Elane que já trabalhou como doméstica, tem três filhos, e hoje estuda para ter formação na área de segurança do trabalho.

Rafaella Barbosa de Holanda, hoje com 27 anos, trocou as aulas esporádicas em uma turma do ensino fundamental pela linha de produção da Kraft. Rafaella até então nunca tinha sequer assinado a carteira de trabalho. “Cheguei a vender artesanato, mas rendia pouco dinheiro. Era só para não ficar parada. Meu marido hoje trabalha na Sadia e eu vivia pedindo para ele levar meu currículo. Acho que ele levou uns 100”, diz Rafaella rindo do próprio exagero. “Realmente sou exagerada. Até que chegou uma hora em que ele disse que não ia mais levar. Para a Kraft levei só um e consegui o emprego”, compara ela, que já se imagina em um cargo maior na empresa. Recentemente, a Kraft levou três funcionárias para serem treinadas para outra função, e Rafaella, foi selecionada.

Do outro lado da BR-232, onde está instalada a fábrica de produtos como o chocolate Bis e os sucos em pó Fresh, trabalha o jovem Diego Rafael Silva de Souza na unidade da Isoeste. Ele chegou a pensar em morar no Piauí e ficar longe da família e da namorada. “Fiz um curso técnico em eletrotécnica e passei três anos no Recife. Aqui não tinha emprego e cheguei a pensar em ir para o Piauí quando recebi uma proposta. Hoje sou inspetor de qualidade e quero continuar na área industrial. Vejo a cidade crescendo. Antes, muita gente aqui trabalhava na feira livre ou de mototáxi. Hoje tem outras oportunidades”.

Fonte: Jornal do Comércio

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